Sérgio Moro, figura pública

Cheguei a ele depois de me adicionarem a um grupo de Facebook, no qual vi vários compartilhamentos a partir do seu perfil. Tomado pela curiosidade, fui conhecê-lo.
Logo reconheci a foto. Aí fui ver o que publica. Achei interessante anotar os temas. Para não parecer que fiz uma seleção a meu critério, seleciono suas dez mais recentes postagens na linha do tempo.
São estas: 1) chamamento a votar em Sérgio Moro como personalidade do ano na Veja; 2) compartilhamento de Fernando Fracischini, com frase do presidente da Associação dos Delegados da Polícia Federal, lamentando seja cobrada austeridade por um Governo com 39 ministérios; 3) compartilhamento de O Antagonista, dizendo que a Andrade Gutierrez foi achacada e por isso doou 100 milhões para a campanha de Dilma; 4) compartilhamento da Folha, dizendo que Israel retaliará o Brasil por ter recusado o embaixador que havia indicado; 5) outro compartilhamento, com notícias de corrupção na Sérvia; 6) foto com homenagem aos delegados da Operação Lava-Jato; 7) compartilhamento de El País, com hashtag ditador, dizendo que Evo Morales usará imagens de Star Wars para tentar obter novo mandato em referendo; 8) compartilhamento de Avança Brasil Maçons, com filme intitulado Projeto dos dez reinos do Clube de Roma – sovietização da América Latina; 9) compartilhamento, via Álvaro Dias, de matéria segundo a qual o Governo gastou R$ 50 milhões em festas e recepções em 2015, enquanto dizia não ter dinheiro para servidores públicos; 10) texto de Reinaldo Azevedo sobre 117 mortos por terroristas antes do AI-5.
Dá para ter uma ideia, não? Quem for lá vai achar muito mais coisas.
Este é o perfil de Sérgio Moro, figura pública. Quando entrei, 119.031 pessoas tinham curtido; no breve espaço de tempo que levei para escrever as palavras acima, o número já estava em 119.192. É, sem dúvida, um pop star.

Não tenho me manifestado sobre a Operação Lava-Jato, e não só por considerar que minha profissão me impeça de fazê-lo. Na verdade, fiz ocasionais comentários críticos, como quando estranhei o fato de uma Vara de Curitiba ter a competência para julgar um processo envolvendo a Petrobrás e de as prisões provisórias parecerem se prolongar até resultarem em delações premiadas.
Por outro lado, meus amigos garantistas se enfurecem quando digo que a investigação sobre crime organizado, em particular quadrilhas que se apropriaram do espaço público, não chegará a lugar nenhum se não tiver a seu dispor a possibilidade de acesso a formas de apuração que envolvam mecanismos mais sofisticados, mesmo que eventualmente possam causar estranheza, se considerados critérios consagrados para os crimes banais.
Sei: eles dizem que essa grande corrupção não se resolve via Direito Penal, que é necessário mudar nossa cultura política, ter uma controladoria eficaz, maior fiscalização das contas públicas, acabar com o financiamento privado das campanhas eleitorais, etc., mas penso que o Direito Penal não pode ser descartado como instância de apuração e punição de crimes dessa espécie, nem podemos imaginar o processo como se fosse um simples processo de furto.
Por isso, sempre vi positivamente o julgamento do Mensalão, o da Lava-Jato, assim como vira antes outras investigações, muitas das quais inexplicavelmente abortadas.
Ademais, nunca duvidei da honestidade de Sérgio Moro nem acreditei nos boatos sobre vínculos partidários em sua família. Aliás, nesse ponto, meus amigos garantistas sempre deixaram claro que suas críticas eram doutrinárias, nunca à competência ou à boa-fé do magistrado.
Circulam, é certo, críticas à sua vaidade, que o exporia a um excesso de visibilidade e o fragilizaria como magistrado, mas ninguém é perfeito, e o próprio lugar que ocupa na condução do processo de certo modo o impele à superexposição.

Depois de ler os compartilhamentos do perfil, cliquei em “Sobre”. Em “descrição curta” está escrito: “Sérgio Fernando Moro é juiz federal criminal e comanda o julgamento dos crimes na Operação Lava Jato.” E: “Página de apoio ao trabalho do Juiz Sérgio Moro.” Em seguida, em “declaração de autoria”: “Importante! Esta página foi criada com o único objetivo de apoiar e divulgar o trabalho do Juiz Sérgio Moro e equipe, assim como os resultados da Operação Lava Jato. Esta página não tem vínculos com o Juiz Federal. Obs: O conteúdo compartilhado e opiniões contidas nas publicações não correspondem o posicionamento ou opinião do Juiz Sérgio Moro.”
Cliquei lá e descobri isso porque não acreditava, pelo conteúdo, que ele próprio publicasse essas coisas. Mais: não acredito que manteria um perfil próprio como figura pública, justamente pelo lugar que ocupa.
Mas, pensei, quantas das agora 119.354 pessoas que curtiram o perfil sabem disso? Quantas se preocuparam em investigar se é ele mesmo quem o mantém? Não faço ideia, mas, pela quantidade de comentários cumprimentando Sérgio Moro, tenho certeza de que percentual elevado das pessoas toma como suas as publicações lá feitas.
Depois pensei outra coisa: será que o próprio Moro sabe que utilizam seu nome? E segui pensando: será que ele se incomoda? Será que vai pedir ao Facebook que retire a página?
Continuei pensando e, confesso, me vieram perguntas em outro sentido: Será que gosta? Se sente contemplado? Quem edita o perfil assume o papel de ventríloquo das suas ideias? Não, não consigo acreditar, e nem deveria ter pensado nisso. Eu sei: o perfil o ajuda a consolidar sua imagem de combatente da moral, que o torna herói da direita brasileira – e até faz campanha para que seja eleito personalidade do ano da Veja –, mas não acredito, porque ele é juiz e porque certamente não é tão tosco para se identificar com o que lá é publicado.
Bem, termino por aqui, quando 119.468 pessoas curtiram o perfil e uma acabou de publicar: “precisamos de pessoas como esse cidadão, sem rabo preso com ninguém.”


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