Um dos grandes problemas das democracias contemporâneas é estarem cada vez mais submetidas ao controle do poder econômico. O fenômeno há muito tempo transformou o parlamento dos Estados Unidos em um lugar oferecido unicamente aos ricos e caminho semelhante se desenha em outros lugares, entre eles o Brasil.
O modelo americano é bem conhecido: bipartidarismo de fato, voto distrital e campanhas milionárias, combinadas com voto facultativo, em que a abstenção dos pobres é altíssima, seja por não acreditarem no sistema, seja por não poderem se dar ao luxo de perder um dia de trabalho para votar. É uma democracia do faz de conta, porque as regras do jogo garantem que tudo continue sempre igual, com os mesmos atores, ora oscilando um pouco à direita, com os republicanos, ora um pouco à esquerda, com os democratas, sem que nada mude.
No Brasil estamos a caminho.
Primeiro, meio que na surdina, as campanhas começaram a ficar mais caras. Eleição após eleição o candidato precisa de mais dinheiro para se eleger, e hoje raros são dos deputados federais que conseguem se eleger com menos de um milhão de reais. O dinheiro, todos sabemos, vem das grandes empresas, que depois cobrarão a fatura.
Claro, há tentativas de mudar isso, mas Gilmar Mendes sentou em cima da ADIN que já tem garantida no Supremo a maioria dos votos para derrubar o financiamento empresarial de campanha e o próprio Congresso não dá mostras de aprovar mudança legislativa que proíba esse financiamento. Aliás, seria esperar muito de quem se beneficia com as doações milionárias.
Eduardo Cunha chegou à presidência da Câmara dos Deputados com o discurso da reforma política para atender a demanda da sociedade. Essa é a ironia que hoje temos de tolerar: a cidadania engrupida com o discurso de que as barbaridades que estão aprontando atenderão ao nosso pedido.
Agora veio a última brilhante invenção: o distritão, que acaba com o voto por legenda, assegurando a eleição dos mais votados, independentemente do partido. Isso, evidentemente, terá muitos efeitos colaterais, como o acirramento da luta intrapartidária, o enfraquecimento ainda maior dos partidos, a multiplicação das candidaturas pop star.
Outro efeito igualmente péssimo para a democracia será a consolidação do modelo plutocrático, porque definitivamente as chances eleitorais se concentrarão naqueles poucos que tiverem muito dinheiro para a campanha, com uma ou outra exceção para figuras de forte apelo público – tipo Tiririca –, que conseguem se eleger só pelo nome.
Tenho, com frequência, lembrado da máxima do Barão de Itararé, segundo a qual de onde menos se espera, daí é que não sai nada. Fazendo uma corruptela, poderíamos dizer que de lá onde esperamos o pior, o pior virá. Temos ainda quase quatro anos inteiros para sermos contemplados por absurdos do Congresso, e a reforma política tem tudo para ser um deles.
A plutocratização está em vias de se consolidar, e o futuro parece nos reservar um Congresso onde os muito ricos aprovam as leis que bem entendem.
–
Para arrematar, ataco de Zero Hora:
1) Não acredito que tenha sido ato falho: no dia 12 de maio, ao escrever que não havia clima para medidas impopulares no Governo do Estado, Rosane de Oliveira se saiu com esta: “Os deputados, que não querem desagradar aos eleitores nem aos financiadores de campanha, ficam particularmente sensíveis diante de galerias lotadas, apitos e cartazes.” A mais importante comentarista política do Rio Grande do Sul deixou bem clara a dependência que os deputados têm em relação a quem financia suas campanhas, coisa que não costuma ser assim escancarada.
2) É meio difícil concordar com Nelson Jobim. Pois ele, que antes de ser ministro foi deputado pelo PMDB, acertou em cheio no artigo O PMDB e o Distritão, publicado na ZH do dia 18 de maio. Explica a proposta, aponta, na forma de perguntas, os seus possíveis efeitos e conclui dizendo que a proposta não contribuirá para a melhora da representação parlamentar, mas agravará seus vícios. Recomendo a leitura.
Deixe uma resposta