Defender a democracia. Defender o respeito às regras do jogo. Parece o óbvio, mas para muitos não passa de jogo de palavras, e as regras do jogo só são respeitadas quando são favoráveis. Quando não são, ainda assim o discurso democrático é dado com todo o cinismo por quem quebra as regras.
Por isso, o mínimo que se pode pedir de alguém que proponha algo diferente das regras postas é que dê uma boa justificativa, em que a preservação da democracia se ponha como norte.
É o caso agora, quando, profundamente abalado o Governo Temer pelo último escândalo, ele perde qualquer possibilidade de ainda se sustentar.
Nesse caso, a alternativa constitucional é a eleição pelo Congresso de um presidente que cumpra um mandato-tampão até o final de 2018. Se a Constituição prevê isso, se esta é a regra do jogo, por que defender Diretas já?
A resposta é simples: a regra do jogo foi quebrada há um ano, quando foi praticado o golpe que retirou do governo a presidente legitimamente eleita.
E, como se viu ao longo desse ano, o golpe não foi só uma vingança de quem perdeu nas urnas, mas um instrumento para implementar um programa que essas mesmas urnas rejeitaram.
Não se esqueça que o mesmo Congresso que praticou o golpe e que agora vota as mais radicais medidas antipopulares da nossa história elegeria esse presidente de ano e meio, talvez com tempo de terminar de fazer o trabalho sujo.
Não se esqueça também que foi o Congresso eleito com doações de campanha em valores nunca antes vistos, em grande medida com caixa 2, feitas por grandes corporações diretamente interessadas no resultado das reformas pretendidas.
Não se esqueça ainda que uma parcela muito significativa desse Congresso vem sendo beneficiada nos últimos dias por uma enxurrada de muitos milhões em dinheiro público, via emendas parlamentares, perdão de dívidas ou outras bondades mais.
Tudo isso para aprovarem medidas rejeitadas pela maioria esmagadora dos brasileiros, solenemente ignorados nessas reformas a toque de caixa. Em condições de normalidade democrática, decisões congressuais que contrariassem os interesses da maior parte da população poderiam ser consideradas parte do jogo. Nas atuais condições, não são.
Além disso, os presidentes das duas Casas, primeiros na ordem sucessória da interinidade pré-eleitoral indireta, estão também envolvidos em denúncias de corrupção, fato que retira sua própria legitimidade.
Hoje há uma insuperável crise de legitimidade, e a solução constitucional da eleição indireta somente estenderia por um ano e meio mais esse quadro.
A Constituição foi ferida de morte com um golpe sem causa. O poder está podre. As eleições indiretas seriam, nessas condições, uma solução na melhor das hipóteses anódina, que nos deixaria suspensos num vácuo de legitimidade; na pior das hipóteses, representariam o aprofundamento do golpe.
Por isso, e porque as regras do jogo foram quebradas antes, cabem agora Diretas já.
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