Um querido amigo, que há tempo não vejo, mas sei que é ardoroso defensor do impeachment e de tudo o que o Moro tem feito, escreveu, sobre quem pensa diferente: quando nos posicionamos, declaramos nosso caráter.
Quero responder a ele.
A primeira coisa que lhe digo é que nossa amizade continua, e continua porque, mesmo achando que ele está errado, o considero uma pessoa de caráter. Talvez justamente para continuar a amizade, não o tenho procurado: queria lhe explicar o motivo de pensar diferente, mas, como os tempos são de não ouvir, acabaríamos brigando.
Então digo aqui, até porque isso serve para outros amigos, que têm falado coisas parecidas.
Não direi que nossas divergências são por pouca coisa, que política não deve ser motivo para tanto: política é, sim, motivo para posicionar-se com firmeza, e nossas divergências são profundas.
Mais: penso que ela deve ser pensada de forma ética e tenho certeza de que o julgamento feito por meu amigo tem um forte componente ético.
Hoje, o grande assunto é corrupção, e meu amigo é contra a corrupção. Mas eu também sou. Talvez ele pense que estou fazendo corpo mole, mas acredito que a combatemos de modos distintos. Ele nunca falou nada sobre a existência de controladorias, sobre limitar financiamentos de campanha, sobre ter critérios éticos para a nomeação de integrantes de Tribunais de Contas, sobre tantas coisas.
Numa coisa ele fala, e concordo: é necessário que haja liberdade de investigação, que nunca mais existam engavetadores. Mas, como tem formação jurídica, compreenderá que considero necessário preservarmos o devido processo legal, o que significa observar o princípio do juiz natural, coibir os vazamentos, evitar os abusos de prisões temporárias, investigar fatos e não pessoas.
Isso é fundamental, e ele há de entender: há regras maiores, que temos de preservar, sob pena de criarmos um Estado policial. Talvez ele pense que em algumas circunstâncias é necessário ser mais maleável, que os fins justificam os meios, mas – ah, meu amigo! – esse pensamento já levou a tantas tragédias.
Não sei se ele acredita que processos criminais acabarão com a corrupção; eu acho que são importantes, mas com certeza não resolverão um problema que passa por profundas mudanças na organização do poder. Gostaria de discutir essas coisas com ele, mas ele sempre achou isso um assunto enfadonho.
Ele é uma pessoa informada, e sabe que o impeachment não tem por fundamento a corrupção – desgraçadamente, não acharam nada contra a presidente –, e até concorda que estão forçando a barra com essa história de pedalada, mas, por não sei que mágica, acha que ele deve ser aprovado para que a corrupção acabe e a ética seja resgatada. Por isso, fica brabo quando ouve que impeachment é golpe.
Gostaria de ver o Cunha cassado, mas acha que há prioridades, e por isso é melhor deixá-lo lá mais um pouco, até que tudo se resolva.
Meu amigo votou no Aécio. Nunca se conformou. Mas nega que isso tenha relação com suas posições de hoje.
Não vou acusá-lo. Quando tudo isso passar, voltamos a falar. E não vamos tocar nesse assunto de caráter.
Deixe uma resposta